Em meio às transformações significativas que a reforma tributária trará para o cenário fiscal brasileiro, uma recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) acende um sinal amarelo que merece atenção especial. O cerne dessa decisão diz respeito à validação de alterações na Lei Kandir, que restringem o direito a créditos de ICMS sobre operações com mercadorias destinadas ao ativo permanente, energia elétrica e comunicações. Embora a decisão do STF tenha sido unânime, seus reflexos podem se tornar um desafio adicional no período de transição da reforma tributária para o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), previsto para ocorrer entre 2026 e 2032.
O contexto atual da arrecadação do ICMS nos estados brasileiros já apresenta desafios consideráveis. Nos últimos anos, muitos estados enfrentaram quedas significativas na arrecadação desse imposto. Por exemplo, apenas no último ano, São Paulo registrou uma queda de 9,9% na arrecadação de ICMS. Diante desse cenário, a decisão do STF, que possibilita que lei complementar altere o conceito da definição da não cumulatividade e restrinja os créditos do ICMS, torna-se motivo de preocupação.
A não cumulatividade é um dos princípios fundamentais do ICMS, e sua preservação é essencial para garantir a justiça tributária e a competitividade das empresas. No entanto, a recente decisão do STF sinaliza uma abertura para que os estados possam limitar ainda mais os créditos do ICMS, criando um ambiente de incerteza no qual os contribuintes podem se ver prejudicados.
O risco se torna ainda mais relevante quando consideramos o período de transição da reforma tributária para o IBS. A reforma já aprovada na Câmara dos Deputados e no Senado Federal prevê a substituição do ICMS pelo IBS, um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) com não cumulatividade plena. Durante esse período de transição, que se estenderá até 2032, os estados enfrentarão desafios significativos de adaptação e de possíveis perdas de arrecadação do ICMS.
Nesse contexto, a decisão do STF que flexibiliza a não cumulatividade do ICMS pode abrir brechas para que os estados utilizem essa flexibilidade para limitar os créditos do imposto. Isso representaria um obstáculo adicional para as empresas, que já estarão lidando com as complexidades da transição para o IBS.
É importante ressaltar que a não cumulatividade é um princípio essencial para evitar a bitributação e garantir que o imposto incida apenas sobre o valor adicionado em cada etapa da cadeia produtiva. Qualquer restrição a esse princípio pode comprometer a eficácia da reforma tributária e criar um ambiente de insegurança jurídica para os contribuintes.
Diante desse cenário, é fundamental que os contribuintes estejam atentos às mudanças na legislação e às decisões judiciais que possam impactar suas operações. Além disso, é essencial que as empresas busquem orientação jurídica especializada para compreender o impacto dessas decisões e se preparar para os desafios que surgirão durante a transição da reforma tributária.
Em resumo, a decisão do STF que flexibiliza a não cumulatividade do ICMS acende um sinal amarelo para os contribuintes e os estados no período de transição da reforma tributária. É fundamental que haja um debate amplo sobre essa questão e que se busque encontrar soluções que garantam a segurança jurídica e a eficácia da reforma, evitando possíveis retrocessos na tributação brasileira. A transição para o IBS é um momento crucial para o país, e é essencial que ela seja conduzida com responsabilidade e planejamento, visando o desenvolvimento econômico e a simplificação do sistema tributário nacional.
Dr. Júlio N. Nogueira
Advogado
OAB/BA 14.470
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