No dia 03/03/2023, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), com placar de 9 x 1, referendou uma liminar anteriormente concedida pelo Ministro Luiz Fux, na Medida Cautelar na ADI 7.195/DF, para suspender os efeitos do art. 3º, inc. X, da LC nº 87/1996, que possuía a seguinte redação, dada pela LC nº 194/2022:
“Art. 3º O imposto não incide sobre: […]
…
X – Serviços de transmissão e distribuição e encargos setoriais vinculados às operações com energia elétrica. (Incluído pela Lei Complementar nº 194, de 2022)”
A maioria dos ministros entendeu que a matéria de incidência de ICMS sobre operações com energia elétrica apresenta controvérsia a respeito da inclusão dos encargos setoriais denominados Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) e Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) na base de cálculo do ICMS.
A discussão estava colocada em saber qual seria a base de cálculo adequada do ICMS na energia elétrica: o valor da energia efetivamente consumida ou o valor da operação, que ampliaria a base do ICMS para incluir nela, também, os encargos tarifários, o que aumentaria o ICMS e o valor da conta de energia.
A ação direta de inconstitucionalidade em questão foi ajuizada por governadores de 11 estados e o do Distrito Federal, na qual se alegou, sobretudo, o comprometimento da arrecadação estadual que passaria a sofrer um prejuízo semestral bilionário, estimado em R$ 16 bilhões, o que, via de consequência, também iria refletir na Receita dos Municípios que recebem 25% da Receita arrecada com o ICMS.
O problema de tudo isso é que, em 2017, na análise do RE 1041816 o STF havia decidido que a discussão relativa à inclusão dessas tarifas na base de cálculo do ICMS seria infraconstitucional, desde então ela vem sendo discutida apenas no STJ, no âmbito do Tema Repetitivo 986.
O STF, retomando o julgamento dessa questão, agora muda seu próprio entendimento anterior e atropela o STJ no meio da faixa de pedestres.
Isso tudo evidencia que um fator importante que pesou na decisão concedida pela Corte diz respeito ao impacto econômico que a mudança legislativa geraria nas contas públicas. Os que acompanham o movimento tributário já têm conhecimento de que o STF, muitas vezes, tem levado em consideração, para além da questão técnica, também, o reflexo de suas decisões no orçamento público.
Do ponto de vista técnico, Gilberto de Ulhôa Canto, um dos maiores tributaristas que ajudou a elaborar o Código Tributário Nacional (CTN), ensina em Parecer publicado em 1992 que:
“o ICMS deverá incidir sobre o preço da energia efetivamente consumida” (Direito Tributário Aplicado – Pareceres, Forense Universitária, 1992).
Parece-nos que a decisão do STF – se for encaminhada no formato proposto até agora – tende a tornar sem efeito futura decisão do STJ no Tema Repetitivo 992, e abrirá espaço para uma eventual modulação dessa discussão, e nela tende a acolher como marco temporal a mudança de posicionamento do STF, que ocorreu em 24/02/2023 (data do início do julgamento da medida cautelar na ADI 7.195/DF), ou dia 03/03/2023 (data da conclusão do julgamento da medida cautelar na ADI 7.195/DF), ou, ainda, 08/03/2023, se o critério que vier a ser utilizado for o da data da publicação da certidão do julgamento.
O certo é que essa mudança de entendimento do STF terá efeitos práticos sobre os processos individuais e coletivos discutindo a incidência do ICMS sobre a TUST e TUSD, que haviam sido ajuizados sob a égide da Lei Complementar nº 87/1996 (de 13/09/1996 à 22/06/2022), e, também, sob a vigência da Lei Complementar nº 194/2022 (de 23/06/2022 até a ADI 7.195/DF).
Nesse mar revolto e com falta de critérios temporais para eventual modulação de efeitos da decisão do STF na ADI 7.195/DF, a cautela indica a necessidade de avaliação séria e criteriosa sobre a possibilidade de ajuizamento de processos discutindo a incidência do ICMS sobre a TUST e TUSD.
De qualquer forma, independentemente da posição, temos que admitir que ela é uma decisão quadrada, que não desce redondo para o contribuinte.
OBS.: Esse artigo foi publicado na Coluna: Tributo em Pauta, no Bahia Notícias.
Dr. Júlio N. Nogueira
Advogado
OAB/BA 14.470
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